top of page
Post: Blog2_Post
  • Foto do escritorAdriana Ferreira

Incentivo à Leitura no Brasil: Por que falar de livros na internet?

Atualizado: 21 de dez. de 2023

A partir da pesquisa Retratos da Leitura do Brasil, vamos analisar os incentivos à leitura e o impacto de falar sobre livros na internet.

banner-raizes-incentivo-a-leitura-no-brasil-por-que-falar-de-livros-na-internet

Confira nossa análise da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (2019), sob o aspecto de incentivo à leitura no Brasil e a importância de falar de livros na internet.


Introdução

Afinal, o Brasil é um país de leitores ou não é?


Quem gosta de livros e cultiva o hábito de ler, acaba criando uma bolha - principalmente no universo digital - repleta de informações sobre livro e literatura, gerando a falsa impressão de que essa é a realidade da maioria.


Entretanto, segundo os dados da 5a edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, principal mapeamento sobre o comportamento de leitores e acesso ao livro no país, apenas metade da população tem o hábito de leitura.


E esse cenário se mantém há muitos anos, pelo menos desde 2001 quando a pesquisa foi realizada pela primeira vez, com o percentual de não leitores estacionado na média dos 50%. Trazendo à tona dúvidas sobre a eficácia das políticas de incentivo à leitura e acesso ao livro, que ao longo de 20 anos não conseguiram melhorar esse retrato.

"A leitura é libertadora e promove o protagonismo no acesso ao conhecimento e à cultura. Ela transforma, informa, emociona e humaniza. Traduz e nos aproxima do que é humano em diferentes tempos, lugares, sentidos, culturas e sentimentos." Zoara Failla.

Uma vez que ler representa educação, desenvolvimento pessoal e de senso crítico, podemos questionar o interesse de governantes em não desenvolver cidadãos leitores. Pode haver um movimento contrário ao de incentivo à leitura, ou pelo menos uma inação, por aqueles que pretendem manter grande parte da população alienada e menos questionadora. E o alerta soa mais alto quando vemos que grande parte do grupo dos não leitores é formado por pessoas de classes C, D e E.


Interessa então compreender o cenário de leitura no Brasil, conhecer o perfil de leitores e não leitores, seu comportamento e motivações para começar e manter o hábito da leitura. E assim compreender quais os incentivos mais efetivos nesse processo e principalmente, refletir sobre qual a importância e impacto de falarmos sobre livros na internet.


Afinal, falar de literatura na internet tem qual objetivo? Eu, há muito, tenho refletido sobre o quanto influenciadores digitais desse meio incentivam a leitura ou a compra de livros? Sem falar, da sensação de bolha em que se fala de livros apenas para convertidos, ou seja, aqueles que já tem acesso ao livro e o hábito da leitura.


Se você é um leitor e entusiasta da leitura, por acreditar na sua importância e relevância, fica comigo até o final do texto e vamos juntos pensar sobre como contribuir para a melhoria do cenário de leitura em nosso país.

“Um público comprometido com a leitura é crítico, rebelde, inquieto, pouco manipulável e não crê em lemas que alguns fazem passar por ideias.” Esta frase de Vargas Llosa nos diz tanto neste momento. Zoara Failla

Principais resultados Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, divulgada em 2020

Antes de analisarmos aqui alguns resultados da pesquisa, vale alinhar o conceito de leitor e não leitor, utilizados por esse mapeamento:

  • Leitor é aquele que leu, inteiro ou em partes, pelo menos 1 livro nos últimos 3 meses.

  • Não leitor é aquele que declarou não ter lido nenhum livro nos últimos 3 meses, mesmo que tenha lido nos últimos 12 meses.

A edição mais recente da pesquisa aconteceu entre outubro de 2019 e janeiro de 2020, portanto não mostra o impacto da pandemia no comportamento de leitura e acesso ao livro. Realizada por amostragem em 208 municípios e 8.076 entrevistas, seus resultados foram divulgados em Setembro/20, com um nível de confiabilidade dos dados em 95%.

A pesquisa mostra que 52% dos brasileiros são leitores e 48% não leitores, uma queda em relação à pesquisa anterior (2015) em que tínhamos 56% de leitores e 44% de não leitores.

Essa redução de leitores aconteceu, principalmente, entre pessoas das classes A (de 76% de leitores para 67%) e B (de 70% para 63%) e entre os que cursaram o Ensino Superior (de 82% para 68%).


Dados que vêm de encontro com outra informação: o principal motivo para não ler apresentada pelos entrevistados foi a falta de tempo. Entretanto, mais de 50% dos respondentes afirmaram usar seu tempo livre com televisão, internet, música e WhatsApp. Sendo o público com nível superior os que apresentaram os maiores percentuais: 86% desses leitores usam com frequência o WhatsApp e 64% usam redes sociais (Facebook, Instagram ou Twitter).


Parece óbvia a relação desses dois dados: falta tempo para ler enquanto se passa mais tempo em plataformas digitais. Principalmente entre aqueles que têm acesso livre à internet, bons dispositivos e condições de arcar com custos de assinaturas.

Mas, não bastasse perder alguns leitores pelo caminho (de 2015 para 2019), ainda existe um significativo percentual de não leitores, estagnados dentro da média dos 50% ao longo dos últimos anos. Qual o perfil desse grupo e por que ainda não foi possível migrar essas pessoas para o grupo de leitores?


Perfil Não Leitores

Além da maioria de respondentes que alega não ler por falta de tempo, encontramos na pesquisa outras justificativas que revelam problemas reais na formação de novos leitores, como não gostar de ler e a ter dificuldades de leitura/acesso aos livros.


Dentre esses motivos: 19% alegam ler devagar, 13% dizem não ter concentração para ler, 9% afirmaram não compreender o que leem e 4% não sabem ler. Isso significa que 45% dos respondentes têm dificuldades frente à leitura, seja de compreensão e/ou capacidade leitora, o que corresponde ao conceito de analfabetismo funcional.


Indicadores que confirmam a precariedade da educação em nosso país, que não garante escolas com boa infraestrutura e educação de qualidade para todos. Atualmente, 60% das escolas públicas do país não possuem uma biblioteca à disposição dos alunos e vivemos sob um período em que a cultura de uma forma geral é desvalorizada e desencontrada. Vimos nos últimos anos leis importantes de incentivo à leitura e de acesso ao livro, serem esquecidas e/ou sofrerem grandes cortes de orçamento, o que inviabilizou a manutenção e continuidade de algumas iniciativas.


Aproximando a lupa para o grupo de não leitores, descobrimos que 3% deles estão na faixa dos 11 a 13 anos, 20% entre 14 a 29 anos e 34% de 50 a 59 anos. Ou seja, pessoas em idade escolar apresentam o menor índice de não leitores, indicando que, apesar das dificuldades, o ambiente escolar ainda desempenha um papel importante no incentivo à leitura e acesso ao livro.


Principalmente para pessoas de maior vulnerabilidade, que encontram muitas vezes apenas na escola o ambiente favorável à leitura, com acesso a livros e o professor como um mediador. Isso se comprova quando 60% dos não leitores afirmam nunca terem visto suas mães lendo e 76% nunca ganharam um livro de presente.

Já dentre os leitores, o professor(a) é a pessoa mais citada como principal motivador para a leitura, reforçando mais uma vez a influência do ambiente escolar.



Perfil leitor

Partindo para o outro grupo de interesse, vamos analisar o perfil dos considerados leitores pela pesquisa.


De maneira geral, o grupo de leitores, representado por 52% de brasileiros, é formado por pessoas mais escolarizadas. Sendo que as com ensino superior chegam a ler duas vezes mais do que pessoas com apenas o ensino fundamental. Já as com renda familiar de 10 salários mínimos mensais chegam a ler até 10 livros por ano, o que é o triplo do que leitores que ganham apenas um salário mínimo mensal. O percentual de leitores também é maior no contexto de famílias com hábito de leitura e /ou com pais/responsáveis leitores.

Dados que corroboram com a ideia de que ter acesso a livros e um ambiente que favoreça o desenvolvimento do hábito de leitura, ainda é um privilégio conectado a melhores condições de vida e educação.


Quanto à motivação para a leitura em geral, 26% afirmam ler por que gostam, já 17% dizem ler para crescimento pessoal. Dentre leitores de literatura, especificamente, 38% afirmam ler apenas por gosto pessoal. Para adultos a escolha do livro é determinada pelo tema, para crianças a escolha é definida pela capa e título da obra.


Quanto ao incentivo que receberam para ler de maneira geral, professores (11%) e a mãe (8%) foram os mais citados como principais influenciadores do gosto pela leitura. Fazendo um recorte dos leitores de literatura, 52% atribuem a um professor a motivação para ler.

Em relação ao acesso ao livro, a maioria afirma ter comprado seus livros ou ter ganho de presente, na sequência o acesso ao livro se dá nas bibliotecas ou pelo o que estiver disponível em casa.


Portanto, fica claro o quanto o ambiente escolar e o familiar são a fonte de livros e formadores de novos leitores, principalmente durante a infância e adolescência. E considerando a desigualdade do nosso país e que milhares de famílias possuem baixa escolaridade e renda, recai para as escolas a maior responsabilidade no incentivo a leitura e disponibilização de livros.


Por isso a extrema importância de políticas públicas que garantam acesso ao livro e a ambientes favoráveis para a leitura, com bibliotecas e profissionais capacitados para serem mediadores de leitura.


Qual a importância de falar sobre livros na internet?


Considerando que a escola e o ambiente familiar são os locais formadores de leitores, qual a importância de falar sobre livros na internet?

Quem gosta de ler e acompanhar nas redes sociais personalidades que falam de livros, divulgando suas experiências de leituras e as últimas novidades em livros, pode pensar que há nisso uma influência na formação de novos leitores.


Entretanto, a pesquisa traz um dado intrigante: leitores em geral não citaram influenciadores digitais como motivadores para seu interesse pela leitura, isso mesmo, 0% de citações nesse sentido. Como já vimos, os mais citados nesta pergunta foram professores ou as mães.

Quando feito um recorte dessa mesma pergunta, apenas para leitores de literatura, 25% afirmam ter se interessado pela leitura através de um influenciador digital (de blogs ou redes sociais), porém apenas 2% consideram suas indicações na hora de escolher sua próxima leitura.


Então, será que essas comunidades digitais em torno do livro contribuem de alguma forma com a melhora no cenário de leitura do Brasil?

Aparentemente, falar de livros na internet não forma leitores. Mas uma vez que 75% dos leitores preferem usar a internet no seu tempo livre, podemos dizer que há muitos leitores no ambiente digital.


E quando questionados sobre quais atividades relacionadas à leitura realizam na internet, 48% do público leitor afirma buscar informações sobre literatura, autores, editoras, lançamentos de livros, 23% acompanham sites, blogs ou fóruns sobre literatura e 16% escrevem em blogs ou fóruns de literatura.


Logo, o digital se torna um ambiente de manutenção do hábito de leitura, o qual propõe novas leituras para além do livro e seus temas, como o funcionamento do mercado editorial e seus atores. Formando comunidades em torno da leitura e de discussões (como clubes do livro ou leituras conjuntas), que relacionam a obra com a realidade a partir de diferentes perspectivas.


Movimentos que mantêm o interesse pelo universo literário, aproximam o público dos seus escritores e produtores. Além de nutrir a curiosidade pelos livros, editoras, eventos literários e outras publicações dentro do universo como revistas literárias, podcasts, adaptações audiovisuais entre outros.


Nesse contexto, surgem também novos fenômenos, principalmente na relação do público com escritores de livros, que antes da era digital eram muito distantes e envoltos em formalidades. Com a internet e as redes sociais, vimos nascer o que Fábio Malini denominou de amigo-seguidor, quando o leitor constrói uma relação mais próxima com escritores, através das redes sociais, fazendo surgir relações de parceria com seu autor de preferência. A partir disso, há mobilizações de comunidades que produzem conteúdos como resenhas, críticas, compartilhamentos, participação em eventos, organizando encontros a favor dos autores favoritos.


O que potencializa a já conhecida capacidade da internet de pautar os temas em evidência. Uma vez que determinado assunto está sendo muito debatido, ele começa também a pautar o “mercado da opinião”, atraindo audiência para aqueles atores envolvidos. Situação que ocorre também nas comunidades de literatura, fazendo algum livro se tornar best-seller apenas pelo boca a boca da internet.


Outro aspecto a se considerar é o aumento da comunidade digital especializada em literatura e que também produz conteúdo na internet, seja através das redes sociais, blogs, sites ou fóruns. Construindo um segmento de análises, por resenhas, críticas e comentários, capazes de legitimar livros e autores.


Todos esses aspectos podem ser considerados positivos para um público leitor com interesse em consumir essas informações, se mantendo cada vez mais envolto no universo da literatura que tanto lhe agrada. Como também, contribui para o mercado editorial, uma vez que essas comunidades se tornam catalisadores para divulgação não só de livros, mas de produtos, eventos ou serviços dentro desse universo.


Porém, há outro lado desse cenário que deve ser levado em consideração, para que essas comunidades digitais não se transformem em uma influência negativa, ou pelo menos, muito restritas.


Uma dessas questões é a criação de bolhas com motivadores primariamente comerciais: o influencer fala apenas do livro que a editora e/ou escritor lhe enviou. Sem uma curadoria prévia do tema, avaliação da relevância ou gosto pessoal pelas obras. Tornando o foco da sua comunicação apenas a divulgação das novidades para venda de livros.


Essa bolha, pode acarretar falta de diversidade de autores, tipos de obras e temas. Focando sempre em produções de regiões já conhecidas como grandes centros comerciais, e que por óbvio, são dominados por grandes editoras, como o sudeste. Deixando a margem produções do interior ou demais regiões do país que não tenham um mercado editorial tão forte e por consequência menos força comercial para divulgação de suas obras e autores.


Outro risco é o incentivo desenfreado e não refletido sobre o consumo de livros e não da leitura. Gerando o desejo de ter o livro ao invés do desejo de ler o livro… Como se valesse mais ter a estante dos sonhos, com edições de luxo e exclusivas em detrimento de ler e refletir sobre o conteúdo da obra. Além disso, distorcer o valor do livro enquanto um instrumento transformador, ainda contribui para um público já ansioso com tanta coisa para fazer, que se vê diante de uma pilha infinita de livros para ler, mas que ainda precisa comprar todos os últimos lançamentos.


Inclusive é muito comum nesse universo vermos a divulgação de metas de leitura e uma corrida desenfreada pelo atingimento das mesmas. Como se ler o livro fosse apenas correr o olho linha a linha, página por página, até chegar ao fim. Num cenário em que contabilizar livros lidos passa a ser o mais importante.


Tudo isso alimenta um círculo vicioso de consumo, ansiedade e frustração diante de tanta oferta do mercado editorial. E não contribuiu em nada para experiências saudáveis e proveitosas de leitura, onde o livro é de fato experienciado com a calma e atenção devida.


Assim, falar de livros na internet pode ser um forte estimulante que mantém viva a paixão pelos livros e pela leitura. Mas, que infelizmente ainda é privilégio daqueles com pleno acesso e condições para participar desse meio. E exige muita atenção e senso crítico, principalmente dos influenciadores e produtores de conteúdo, para não atravessar a linha tênue que divide o interesse pelo livro do interesse pelo consumo de livros.


Fica a reflexão!

E você o que pensa sobre o assunto? Vamos conversar nos comentários!

 

Sobre a Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil

Criada em 2000 pela Abrelivros, CBL e SNEL , a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil tem o objetivo de mapear o cenário da leitura no país. Em 2005, essas instituições criam e passam a manter o Instituto Pró-Livro, que dentre outras atividades assume a realização da pesquisa a cada 4 anos.


A única de abrangência nacional que mapeia o comportamento de leitores e não leitores brasileiros, a pesquisa utiliza a metodologia do Cerlalc para possibilitar a comparação com estudos de outros países ibero-americanos. A recorrência de sua aplicação, permite também a criação de um histórico comparativo inédito no país.


Histórico

A primeira edição da pesquisa ocorreu em 2001. Na época era realizada pela CBL e Snel, com apoio da Bracelpa, utilizando outra amostragem e metodologia.


A partir da sua segunda edição, em 2007, o Instituto Pró-Livro assume a gestão da pesquisa e adota uma metodologia de padrão internacional, facilitando a comparação de seus resultados com outros países com o português ou o espanhol como principal idioma.


O formulário de perguntas também foi ampliado para mapear mais detalhadamente o perfil leitor e hábitos de leitura. A amostragem também aumentou, incluindo crianças a partir de 5 anos e estudantes da educação básica, para avaliar políticas públicas voltadas ao incentivo da leitura e acesso ao livro.


Desde então, a cada edição a pesquisa sofre atualizações a fim de adequar o questionário a novas realidades, como, por exemplo, leitura digital, consumo de livros, acesso e uso de bibliotecas.


A pesquisa mais recente, foi realizada entre 2019 e 2020 com apoio do Itaú Cultural e aplicação pelo Ibope Inteligência. Utilizando uma amostragem ampliada que permitiu definir o perfil leitor de todas as capitais do país e Distrito Federal. O questionário também passou por atualizações, com novas questões sobre comportamento, leitor e leitor de literatura.


Divulgação dos Resultados

Os resultados da pesquisa são amplamente divulgados por seminários e eventos pelo país, contando com a presença de educadores, pesquisadores e trabalhadores da área, como também gestores de educação, cultura e mercado editorial.


É publicado também o livro Retratos da Leitura, coeditado pelo IPL, composto por artigos e análises sobre a pesquisa, escritos por especialistas da área.



 
foto-escritora-dri-ferreira-blog-raizes

Obrigada por ler! 🤓

Espero que tenha gostado dessa leitura.

📨 Se quiser acompanhar as novidades do blog, se inscreva em nossa newsletter, é grátis.

🔗 Se quiser compartilhar esse texto com amigos, use os botões abaixo e leve-o para sua rede social preferida.

Nos vemos no próximo texto 🥰



Posts Relacionados

Ver tudo
bottom of page