Premiação e fundação foram criadas em homenagem ao escritor que trouxe reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.
Conheça aqui o Prêmio Literário José Saramago e uma visita à Fundação do escritor em Lisboa.
Qual a melhor maneira de manter as histórias de um grande escritor vivas?
No caso de José Saramago, temos uma premiação literária e uma fundação em sua homenagem.
O Prêmio Literário José Saramago, foi criado em 1999, para celebrar a conquista do Prêmio Nobel de Literatura pelo autor em 1998.
Já a fundação foi criada em 2007 e é uma iniciativa de amigos e admiradores visando organizar, preservar e perpetuar a obra do escritor.
Tive o prazer de conhecer a fundação e a história desse grande escritor e conto aqui, neste singelo texto, um resumo de sua trajetória e os detalhes da premiação criada em sua homenagem.
Sobre o Prêmio Literário José Saramago
Criado em 1999, promovido pela Fundação Círculo de Leitores, com posterior apoio da Fundação José Saramago, da Porto Editora e da Globo Livros, a premiação nasce como marco do reconhecimento máximo dado a Saramago um ano antes, ao receber o Prêmio Nobel de Literatura.
Com o objetivo de estimular a publicação de obras em língua portuguesa por jovens autores, o prêmio reconhece escritores de até 40 anos que publicarem uma obra literária inédita de ficção, romance ou novela, com um mínimo de 200 mil caracteres com espaços, escrita em língua portuguesa, em qualquer país lusófono.
De recorrência bianual, o processo de seleção tem uma primeira fase de escolha das obras finalistas, que serão avaliadas pela Comissão Executiva, formada por um Comitê de Leitura que avaliará a regularidade da inscrição e fará a leitura completa dos livros.
Cada edição premia um único escritor ou escritora, com a publicação e distribuição da edição em todos os países da lusofonia. Sendo no Brasil publicada pela Globo Livros e em Portugal e demais países pela Porto Editora.
O autor também recebe uma premiação em dinheiro no valor de € 40.000,00 (quarenta mil euros).
Até o momento, já foram laureados quatro vencedores brasileiros: Adriana Lisboa, em 2003, Andréa del Fuego, em 2011, Julián Fuks, em 2017 e Rafael Gallo, na última edição, em 2022. Confira a lista completa de vencedores aqui.
Sobre o escritor José Saramago
Filho de pais agricultores, nasceu em 1922, na aldeia de Azinhaga. Após servir na Grande Guerra, seu pai passa a trabalhar como policial de segurança pública (função que, na época, não exigia mais do que saber ler e escrever) e a família se muda para Lisboa.
Nessa época, perdeu seu irmão mais velho e presenciou as dificuldades financeiras da família ainda bastante humilde. Situação que inclusive o leva a viver alguns períodos na casa dos avós, que ele sempre reconheceu como fundamentais em sua criação.
E é para esse avô, que ajudou em sua formação, que Saramago se refere na frase de abertura do seu discurso mais famoso, proferido ao vencer o Prêmio Nobel de Literatura: “O homem mais sábio que conheci em toda a minha vida não sabia ler nem escrever”.
Saramago, sempre foi bom aluno, na segunda série já escrevia sem erros ortográficos e cursou a terceira e a quarta série juntas. Fez dois anos de Liceu (ensino médio) e teve que parar os estudos por questões financeiras.
A família era humilde e ele precisava trabalhar, portanto, cursou o ensino profissional por cinco anos onde aprendeu o ofício de serralheiro mecânico. No curso havia uma disciplina de Literatura e foi nela que ele descobriu seu prazer pela leitura e pela escrita.
Trabalhou por dois anos em uma oficina até conseguir um emprego como funcionário público. Nesse mesmo período, passou a frequentar, à noite, após o trabalho, a biblioteca pública de Lisboa e segundo ele, “sem ajudas nem conselhos, apenas guiado pela curiosidade e pela vontade de aprender, que o meu gosto pela leitura se desenvolveu e apurou”.
Em 1947 publica seu primeiro livro nomeado pelo autor de A Viúva, mas publicado com o nome Terra do Pecado, por recomendações da editora. Até 1953, escreveu seu segundo romance, Claraboia, que acabou sendo publicado apenas postumamente.
Nessa fase, viveu um hiato em sua carreira de escritor, ficando 19 anos afastado da literatura. No período perdeu seu emprego na administração pública por questões políticas e teve de voltar a atuar como metalúrgico. Tempo mais tarde, consegue uma oportunidade como produtor na editora, Estúdios Cor, emprego que lhe colocou em contato com importantes escritores portugueses.
Por passatempo e em busca de renda extra, a partir de 1955 passa a traduzir obras literárias de seu interesse pessoal. Também exerceu a função de crítico literário nos anos de 1967 e 1968. Contudo, em 1966 volta ao trabalho literário, publicando em sequência: Os Poemas Possíveis (1966) e Provavelmente Alegria (1970), ambos de poemas; Deste Mundo (1971) e Outro e A Bagagem do Viajante (1973), ambos de crônicas publicadas em sua fase de crítico literário.
Paralelamente a escrita, sua carreira segue em movimentação: ainda em 1971 assume como editor no Diário de Lisboa e em 1975 é nomeado diretor-adjunto do Diário de Notícias, função que perderia novamente por consequências da ditadura instaurada após o golpe político militar.
Sem emprego, dedica-se totalmente à literatura e em 1976 se muda para Lavre, uma região rural da província do Alentejo. Lá realiza as observações que serviram de base para a obra Levantado do Chão e o modo de narrar que caracteriza a sua ficção novelesca.
Nos anos que seguem Saramago publica mais algumas obras de conto, teatro e diversos romances. Até que um deles, O Evangelho segundo Jesus Cristo, de 1991, sofre censura pelo governo português, sob alegação de ofender a igreja católica e o autor e sua então esposa, Pilar, se mudam para a ilha de Lanzarote, no arquipélago de Canárias.
De lá, segue escrevendo e publicando. Desse período nasceram mais peças de teatro, romances e um diário publicado em cinco volumes. Saramago já era reconhecido por seu estilo próprio de escrita e como um dos principais responsáveis pelo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.
Mas, é a partir de 1995 que sua carreira como escritor ganha novo peso, com o recebimento do Prêmio Camões e na sequência, em 1998, com o Prêmio Nobel de Literatura. Com visibilidade internacional, Saramago viaja pelo mundo participando dos mais diversos eventos e recebendo infinitas homenagens, tanto na área literária como por seu posicionamento social e político.
Em todas as oportunidades, defendeu o cumprimento da Declaração dos Direitos Humanos e seu desejo de uma sociedade mais justa, com menos poder ao comércio e mais valor à vida humana.
Mesmo em meio a uma agenda atribulada não deixou de escrever e publicar, foram mais de 10 livros até 2009. Algumas de suas obras também são adaptadas para o cinema, teatro, espetáculos de dança e tantas outras manifestações artísticas. Conquistando o público com reflexões relevantes sobre a condição social e os interesses do ser humano.
Em 2010, o escritor faleceu, mas seu legado segue em movimento. Seu romance Claraboia, concluído em 1953, é publicado postumamente em 2011; e, Alabardas, alabardas, Espingardas, espingardas, obra que Saramago escrevia em 2010, quando faleceu, é publicada incompleta em 2014.
Esse é um resumo da vida e obra de um grande homem e escritor, que a partir de origens humildes e mesmo sem um estudo formal, trilhou uma carreira admirável na literatura. Reconhecido e respeitado, mundialmente, por suas ideias e postura social.
Resultado da união de homens e mulheres de diversos países, que visam reunir e preservar a memória e obra do escritor, em 2007, cria-se, em Lisboa, a Fundação José Saramago. Com o objetivo de defender e divulgar a literatura contemporânea, o cumprimento da Carta dos Direitos Humanos, o cuidado do meio ambiente.
Com o autor ainda em vida, os idealizadores da fundação o solicitaram as diretrizes que nortearão as atividades da instituição. Em texto, Saramago respondeu um tanto modesto, mas como sempre convicto: “Nem por vocação, nem por opção nasceu a Fundação José Saramago para contemplar o umbigo do autor. Sendo assim, entre a vontade e o desejo, eis as minhas propostas:”.
Após breves e inspiradoras justificativas, lista suas diretrizes:
“a) Que a Fundação José Saramago assume, nas suas atividades, como norma de conduta, tanto na letra como no espírito, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, assinada em Nova Iorque no dia 10 de dezembro de 1948.
b) Que todas as acções da Fundação José Saramago sejam orientadas à luz deste documento que, embora longe da perfeição, é, ainda assim, para quem se decidir a aplicá-lo nas diversas práticas e necessidades da vida, como uma bússola, a qual, mesmo não sabendo traçar o caminho, sempre aponta o Norte.
c) Que à Fundação José Saramago mereçam atenção particular os problemas do meio ambiente e do aquecimento global do planeta, os quais atingiram níveis de tal gravidade que já ameaçam escapar às intervenções correctivas que começam a esboçar-se no mundo.”
Reconhecendo a amplitude e desafio do seu pedido, encerra: “Bem sei que, por si só, a Fundação José Saramago não poderá resolver nenhum destes problemas, mas deverá trabalhar como se para isso tivesse nascido. Como se vê, não vos peço muito, peço-vos tudo. Lisboa, 29 de Junho de 2007”.
O espaço, fixado atualmente na Casa dos Bicos, em Lisboa, exibe no primeiro andar toda a vida e obra do autor, em uma exposição permanente intitulada: “As sementes e o fruto”.
A mostra também conta com uma reprodução do escritório de Saramago, com itens originais como uma de suas máquinas de escrever, seus óculos e alguns livros de sua biblioteca particular. Além de inúmeros manuscritos originais, fotos e agendas pessoais, recortes de jornais e os registros de momentos marcantes de sua carreira, como o dia em que recebeu o Prêmio Nobel.
Nos demais andares encontramos uma livraria, que além das obras do autor vende também artigos em sua homenagem; um auditório para eventos e uma parte da biblioteca particular do escritor, além dos escritórios administrativos da fundação.
Uma visita realmente interessante, que nos mostra a grandiosidade e complexidade desse escritor que marcou a literatura em língua portuguesa, com suas obras e sua atitude perante a vida.
“O paradoxo da existência humana está em morrer-se em cada dia um pouco mais, mas que esse dia é, também, uma herança de vida legada ao futuro, que o futuro, longo ou breve, seja ele, deverá assumir e fazer frutificar”.
Obrigada por ler! 🤓
Espero que tenha gostado e se inspirado a quem sabe se inscrever na premiação! Para mais textos como esse, continue lendo a série Reconhecimentos Literários.
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Nos vemos no próximo texto 🥰
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