Sim, estamos todos exaustos! E esse ensaio de Byung-Chul Han explica como nos tornamos a Sociedade do Cansaço.
Confira a resenha do livro: Sociedade do Cansaço, de Byung-Chul Han, com tradução de Enio Paulo Giachini e publicado pela Editora Vozes em 2015.
Como nos tornamos a Sociedade do Cansaço? Nesse ensaio, Byung-Chul Han consegue traduzir os dilemas do nosso tempo, pondo luz em fatos negativos, mas que por muitos são vistos com bons olhos: ser bom em tudo, sempre dar conta, tendo vida social e sucesso profissional.
Destacando nossa aversão ao descanso e o uso excessivo de medicamentos para nos mantermos ativos, produtivos e felizes. Numa realidade em que todos estão cansados, estar cansado também nos causa uma sensação de pertencimento.
Lançado em 2015, na Alemanha, o livro chegou ao Brasil em 2017, pela Editora Vozes. E em 2020, Sociedade do Cansaço já estava em sua 9ª reimpressão. Para quem está tendo contato com a obra pela primeira vez somente agora, esse trecho da primeira página pode chamar atenção: "Apesar do medo imenso que temos hoje de uma pandemia gripal, não vivemos numa época viral". Corta para 2020, com todos nós isolados em uma pandemia viral que já dura 2 anos…
O fato é que, apesar de sabermos da possibilidade de uma pandemia, era impossível prever quando e onde ela começaria, logo Byung-Chul Han jamais imaginaria que seu livro faria tanto sucesso justamente em um período pandêmico. Ironias da vida. O autor, entretanto, faz essa afirmação para introduzir o tema principal de seu livro: para ele o século XXI não é um período de doenças virais ou bacteriológicas, mas sim de doenças neuronais.
Depressão, burnout, TDAH, ansiedade entre tantas outras, são as enfermidades da vez. Na lógica proposta pelo autor, em épocas de doenças virais ou bacteriológicas vivíamos um período imunológico, onde o objetivo era rejeitar todo o corpo estranho que entrasse em nosso organismo. Ou seja, negativávamos esse corpo e isso era importante.
Porém, atualmente, ao trocarmos a alteridade: que seria capaz de causar a reação imunológica, pela diferença: que não acarreta nenhuma resposta imunológica, estaríamos, na verdade, aceitando e acumulando mais do mesmo.
Os discursos com excesso de positividade estariam nos adoecendo, dado que não desenvolvemos mais nosso sistema imunológico contra o organismo estranho, como aqueles momentos negativos que fazem parte da vida. Portanto, o excesso de positividade e de aceitação do igual que nos adoece.
Não havendo defesa, o excesso de positividade causa na mesma medida excesso de produção, de comunicação e desempenho em geral. Como consequência, ao invés de reações imunológicas, o corpo reage rejeitando tudo isso, por esgotamentos físicos e mentais, desenvolvendo doenças psicológicas.
Faz sentido pra você?
Esse comportamento resulta da evolução da sociedade disciplinar, para a sociedade do desempenho, na qual, pensadores como Foucault afirmam que a sociedade disciplinar estava cercada de presídio, fábricas, asilos, hospitais, tinham poderes e direitos limitados, por leis ou mandamentos; mas hoje, segundo Byung-Chul Han a sociedade está imersa em escritórios, academias, shoppings, num ambiente mais permissivo com muita iniciativa e motivação para sempre desempenharmos algum papel. Seríamos nós, então, os sujeitos de desempenho e produção os famosos empresários de si mesmos.
Algo que conversa muito bem com o fenômeno conhecido como a uberização do trabalho ou a plataformização do trabalho, onde milhares de pessoas trabalham horas a fio, sem nenhum direito ou garantia, para conseguir manter um padrão de ganhos. E sob a ilusão de serem donos do seu tempo, com mais flexibilidade e autonomia.
"A sociedade disciplinar ainda está dominada pelo não. Sua negatividade gera loucos e delinquentes, a sociedade do desempenho, ao contrário, produz depressivos e fracassados".
Assumir total responsabilidade por nossas vidas, acreditando que só depende do nosso esforço e iniciativa gera pressão e frustração, uma vez, que isso ignora as diferentes realidades em que vivemos, dando crédito a falácia da meritocracia.
Acreditar que somos nossos próprios chefes e que quanto mais fizermos, mais conquistaremos, nos torna o que o autor chama animal laborans: um homem depressivo que explora a si mesmo com uma falsa ideia de liberdade.
O excesso de estímulos também se reflete no excesso de positividade. Ser multitarefas e estar hiperconectado, se caracterizam pelo dinamismo e superprodução, o que nos afasta do tédio e de atenções mais profundas. Na era da economia da atenção, viver o tédio pode ser considerado perda de tempo. Entretanto, somente a partir do tédio é que podemos gerar o novo, evoluir, a viver uma vida contemplativa.
"A perda moderna da fé, que não diz respeito apenas a Deus e ao além, mas à própria realidade, torna a vida humana radicalmente transitória."
São tantos os anseios, os estímulos, as comparações e para a vida dar certo no meio desse caos, não basta pensar positivo. Pelo contrário, reconhecer as falhas do sistema, conhecer nossas fraquezas e erros é o que nos faz humanos e pensar sobre isso pode nos tirar do fluxo.
Nomear sentimentos e fenômenos sociais, também nos ajudam a compreender e processar melhor sobre eles. Discutir sobre positividade tóxica, sociedade do cansaço, a ilusão de que ser produtivo nos leva a algum lugar, pode ser o primeiro passo para reconhecermos nossa condição.
E termos a oportunidade de questionar tudo isso, mais uma vez nos coloca em uma situação de privilégio. Poder pensar em uma sociedade extremamente exploratória e desigual, deve ser também a prerrogativa de repensarmos nossas atitudes, escolhas e relações.
Seguir produzindo e consumindo até a exaustão, sem oportunizar o tédio e a contemplação, não só desperdiça um direito de poucos, como também mantém a máquina da exploração funcionando em plenas condições. Trabalhar enquanto eles dormem, só vai nos deixar mais cansados e pertencentes a esse sistema.
Vale muito a leitura e a reflexão!
Sobre o autor:
O filósofo e ensaísta sul-coreano, Byung-Chul Han, é formado em Metalurgia na Universidade da Coreia, mas estuda filosofia desde a década de 80. E dedica seus estudos sobre as estruturas sociais do século XXI e como o capitalismo interfere na saúde mental das pessoas.
Lançando termos como sociedade do cansaço, sociedade da transparência e positividade tóxica, suas obras questionam e criticam o contexto de hiperconectividade, alto desempenho e produtividade. Relacionando essa forma de vida a crescente de doenças psíquicas, como síndrome de burnout, a depressão e o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH).
Atualmente trabalha como professor de Filosofia e Estudos Culturais na Universidade de Berlim.
Se você gostou da resenha do livro, confira abaixo o link para adquirir a obra e outros conteúdos que vão enriquecer ainda mais a sua experiência de leitura:
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Link para demais livros do autor: seleção de obras.
DOC GNT: Sociedade do cansaço - Com 10 episódios, a série tem como base o livro Sociedade do Cansaço, de Byung-Chul Han. Cada episódio traz profissionais para debater diversos temas que tem nos cansado bastante ultimamente como trabalho, consumo, positividade, remédios entre outros. Vale assistir! Dirigido por Patrick Hanser, a série está disponível na GNT e no Globoplay.
Podcast Mamilos, comandado por Cris Bartis e Juliana Wallauer, fez um episódio explicando "O que é Sociedade do Cansaço?". Participam do papo o filósofo Marcio Krauss e a psicóloga Jeane Tavares, que também participaram da série na Glopoplay. Tá bem boa essa conversa, vale ouvir!
Obrigada por ler! 🤓
Espero que tenha gostado e se inspirado a ler o livro.
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Nos vemos no próximo texto 🥰
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